Palavra da Cá

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quarta-feira, 1 de abril de 2009

SOMBRA E ÁGUA FRESCA


(Este texto foi publicado há algum tempo no jornal A Cidade. Acho que vale a pena repetir)

Nos idos dos anos 50/60, elas sombreavam quase todas as ruas da cidade. Enfileiradinhas, bem comportadas, a copa não muito grande fazia uma espécie de abóboda protetora sobre nossas cabeças, guardando-as da canícula que já castigava Ribeirão.
Não me lembro do nome. Sei que suas folhas eram rijas, alongadas, brilhantes e seus galhos traziam cachos de bolinhas verdes que eram a delícia dos moleques e seus estilingues. Até hoje me lembro da sensação que a nervura central da folha provocava nos dedos e do barulho que fazia ao quebrar-se em duas.
Essas árvores acompanharam minha infância e adolescência, tempo em que caminhávamos muito mais a pé do que de automóvel. Mas as ruas, então, dormiam frescas nas horas sonolentas da tarde. Sob seus galhos brincamos de amarelinha, pega-pega, pique, queimada, betsi. E à noite ainda protegiam os casais de namorados do olhar reprovador da rígida moral vigente.
Acreditem. Ribeirão Preto já foi uma cidade verde. E não eram só as árvores de calçada, mas as praças que, então, existiam em número suficiente para abrigar a população e, claro, o Bosque Municipal, onde todo mundo ia passear aos domingos.
Aí a cidade cresceu. E esqueceram-se das árvores. Centenas de ruas rasgaram a paisagem em todas as direções. Bairros inteiros nasceram, cresceram, transformaram-se, verticalizaram-se. Mas as árvores tornaram-se cada vez mais raras. Quaresmeiras, Sibipirunas, Chapéus de Sol, Paineiras com suas copas imensas e suas cores pontilhando os verões intermináveis foram rareando até quase desaparecer.
Hoje em dia, atravessamos quarteirões inteiros sem uma única árvore; percorremos bairros sem praças e, com a deliciosa exceção do Curupira e de mis um ou dois, ainda com árvores franzinas, carecemos de parques públicos. Não tenho comigo os números, mas a porcentagem de verde por habitante em Ribeirão é vergonhosa e está muito abaixo daquela determinada pela ONU – ao contrário de cidades como Araraquara ou Curitiba, onde os índices de verde são mais que suficientes.
O resultado, além do calor cada vez mais insuportável, é o desequilíbrio ambiental, a oxigenação diminuída, o ar sufocante e, não menos importante, a ausência de locais de lazer e encontro para a população.
Não sei se a idéia é viável, mas algum vereador de boa vontade podia propor uma lei que obrigasse os proprietários de imóveis a plantaram árvores a cada X metros em suas calçadas. As mudas poderiam ser cedidas pelo Horto Municipal. E quem não cumprisse a lei, pagaria uma multa no IPTU. Não me parece difícil. Afinal, qualquer cidadão pode plantar uma árvore – não pesaria para ninguém e todos se responsabilizariam pela saúde e a beleza da cidade.
É uma idéia. No mínimo porque sombra e água fresca é bom e eu gosto.

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