Palavra da Cá

Este Blog quer partilhar textos literários e nem tanto com vocês.
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segunda-feira, 28 de junho de 2010

Bola de Meia

A Ciça borda bolas de meia.
Escolhe-as coloridas e macias e põe-se a desenhar com agulha e linha sobre essas esferas pascoalinas e inesperadas.
Sim, porque ninguém espera que a Ciça se enrosque em bolas de meia e varandas. Afinal, ela é doutora em lingüística e até há pouco tempo carregava sobre os ombros uma cabeça irretocável, onde ninguém adivinharia estes contornos imprevisíveis de linha, fitilhos, sianinhas.
Mas a Ciça surpreende até o mais cético dos filósofos. Carrega a cesta de bolas pela grande casa envidraçada, de onde se avista a paisagem e o tempo de bordar. E percorre o território de malha e lã com a desenvoltura de um posseiro e a graça de quem investe em coisas inúteis – como escrever poesia.
Os poemas da Ciça, ela os cria nas bolas de meia, circundando aquarelas, prespontando geometrias, enfeitando o dia.
Estes enfeites de paciência e mãos de fada não têm tempo nem exatidão. Herança de avó, dispensam análises sintáticas, coerência, coesão. Espalham-se pela tarde de café, pão e manteiga; filho abrindo o coração da gente. Ensinando-nos a alargar os braços e afagar bolas de meia com as mãos.

Um comentário:

Anônimo disse...

Textos saborosos, nostálgicos como cheiro de grama cortada em tarde fresca. Cada um melhor que o outro, lembranças sem limites.
Cordiais saudações de uma fã.
Marlene de Souza

marlenedesouza67@gmail.com